terça-feira, 6 de novembro de 2007

“(..) Enquanto alguns fazem amor, outros fazem comícios, outros fazem análises e outros fazem doces. Eu vejo, eu sinto, eu cheiro isso tudo. Mas faço Filosofia. Ser ou estar. Não, não é ser ou não ser, essa já existe, não confundir com a minha que acabei de inventar agora. Originalíssima. Se eu sou, não estou porque para que eu seja é preciso que eu não esteja. Mas não esteja onde? Muito boa essa pergunta; não esteja onde. Fora de mim, é lógico. Para que eu seja assim inteiro (essencial e essência) é preciso que não esteja em outro lugar senão em mim. Não me desintegro na natureza porque ela me toma e me devolve na íntegra: não há competição mas identificação dos elementos. Apenas isso. Na cidade me desintegro porque na cidade eu não sou, eu estou: estou competindo e como dentro das regras do jogo (milhares de regras) preciso competir bem, tenho conseqüentemente de estar bem para competir o melhor possível. Para competir o melhor possível acabo sacrificando o ser (próprio ou alheio, o que vem a dar no mesmo). Ora, se sacrifico o ser para apenas estar, acabo me desintegrando (essencial e essência) até a pulverização total. Vaidade das vaidades. Apenas vaidade. A conclusão é bíblica mas responde a todas as perguntas deste mundo desintegrado e confuso. Os loucos reinando sobre os vivos e mortos. Dominarão os poucos que conseguirem segurar as rédeas da loucura, quais? Pulmões e mentes poluídas. Importante papel está reservado aos psiquiatras. Aos profetas, acredito ainda mais nos profetas. Acho que eu seria mais útil se estudasse medicina, de que vão adiantar no futuro as leis se agora já são o que se sabe. Um psiquiatra maravilhoso. O chato é que quando leio um livro sobre doenças metais, descubro em mim os sintomas de quase todas, um psiquiatra por dentro demais da loucura. Salvo pelo amor (...)
Queria ser mas vou estar na engrenagem do faz-de-conta (...) “

Adaptação do trecho do romance “As Meninas”, cap. Nove – Lygia F. Telles